Durante todo o filme a presença marcante das sombras de cada objeto projetadas no chão, nas paredes, nos fazem lembrar de alguma forma o teatro de sombras chinês. Isto se evidencia na técnica de luz arquitetada pela artista. Nesta película, tudo tem sombra. Ela é uma presença constante. E se não anuncia uma tragicidade, antecipa uma ação.
A música de Teijo no filme nos reporta a uma poética da fragilidade, mas também de uma marcação que tensiona, introspecta, suspende e joga com a emoção também em niveis cíclicos.
Dheren compõe seu filme de uma maneira reflexiva que torna muito dificil distinguir entre sonho e realidade. Os jogos que faz com espelhos tanto em detalhes de reflexões em objetos, como o metal da faca e os vidros das janelas nos fazem pensar sobre a trasparência dos limiares, e nos trazem poéticas sobre uma existência fragmentada.
O contraponto entre ordem e espontaneidade, entre desejo e morte é a tônica do filme. Porisso, entendo porque ela repete praticamente o mesmo movimento mostrando o diferente numa trajetória semelhante, como numa tentativa de compreenção e de discernimento.
O primeiro movimento cênico nos anuncia como num prólogo sobre o que se sucederá. Seguindo o movimento das imagens, o foco do olhar, da câmera que valoriza uma faca sobre o pão e que cai abrupta em cima da mesa, nos surpreende nos mergulha nos mistérios e desse modo estamos preparados para o desfecho.
A presença importante de certos objetos como o jornal e o telefone abertos, alude para uma comunicação cortada (a garganta), um trâmite análogo ao movimento de fora pra dentro da casa. Outros objetos como a flor nos dizem muito sobre a personagem, assim como a chave da porta que por várias vezes aparece, ou como referência de um falo, ou de uma fala que penetra e abre, entre perspectivas.
Vida e morte.
A este propósito o espelho que ora configurava seu duplo tanto numa imagem feminina de preto com a flor, quanto na figura de um homem, se quebra por um golpe decisivo e muito refletido. Esta quebra nos fala da efemeridade das coisas, das ilusões, e nos lança no inconsciente de um oceano também espelhado, mas móvel, das possibilidades.
A profundidade da penetração feminina talvez seja a coisa mais invisível.
Gilmar Azeredo - Mestrando em Educação e Comunicação PPGE-UFSC.
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