sábado, 13 de novembro de 2010

Sobre Meshes of the afternoon – Gil Azeredo

O filme de Maya Dheren, Meshes of the afternoon, de 1943 nos apresenta um situação surreal, onírica, que nos prende, nos leva num movimento espiral de desdobramento dos múltiplos da personagem na trama. Estes desdobramentos se relacionam com os níveis dos espaços cênicos: a rua, a escada externa, a sala, a escada interna,  o quarto.

Durante todo o filme a presença marcante das sombras de cada objeto projetadas no chão, nas paredes, nos fazem lembrar de alguma forma o teatro de sombras chinês. Isto se evidencia na técnica de luz arquitetada pela artista.  Nesta película, tudo tem sombra. Ela é uma presença constante. E se não anuncia uma tragicidade,  antecipa uma ação.

A música de Teijo no filme nos reporta a uma poética da fragilidade, mas também de uma marcação que tensiona, introspecta, suspende e joga com a emoção também em niveis cíclicos.

Dheren compõe seu filme de uma maneira reflexiva que torna muito dificil distinguir entre sonho e realidade. Os jogos que faz com espelhos tanto em detalhes de reflexões em objetos, como o metal da faca e os vidros das janelas nos fazem pensar sobre a trasparência dos limiares, e nos trazem poéticas sobre uma existência fragmentada.

O contraponto entre ordem e espontaneidade, entre desejo e morte é a tônica do filme. Porisso, entendo porque ela repete praticamente o mesmo movimento mostrando o diferente numa trajetória semelhante, como numa tentativa de compreenção e de discernimento.

O primeiro movimento cênico nos anuncia como num prólogo sobre o que se sucederá. Seguindo o movimento das imagens, o foco do olhar, da câmera que valoriza uma faca sobre o pão e que cai abrupta em cima da mesa, nos surpreende nos mergulha nos mistérios e desse modo estamos preparados para o desfecho.

A presença importante de certos objetos como o jornal e o telefone abertos, alude para uma comunicação cortada (a garganta),  um trâmite análogo ao movimento de fora pra dentro da casa. Outros objetos como a flor nos dizem muito sobre a personagem, assim como a chave da porta que por várias vezes aparece, ou como referência de um falo, ou de uma fala que penetra e abre, entre perspectivas.

Vida e morte.

A este propósito o espelho que ora configurava seu duplo tanto numa imagem feminina de preto com a flor, quanto na figura de um homem, se quebra por um golpe decisivo e muito refletido. Esta quebra nos fala da efemeridade das coisas, das ilusões, e nos lança no inconsciente de um oceano também espelhado, mas móvel, das possibilidades.

A profundidade da penetração feminina talvez seja a coisa mais invisível.

Gilmar Azeredo - Mestrando em Educação e Comunicação PPGE-UFSC.


Nenhum comentário:

Postar um comentário